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Após anos o médico e escrito Drauzio Varela retorna com o outro lado de uma narrativa

Em Estação Carandiru ele focou na população carcerária, agora o ponto focal do livro são os funcionários do sistema carcerário brasileiro

Com uma sinceridade impactante o autor não joga panos quentes em situações problemáticas e não demoniza nenhum lado.

Com relatos pessoais de muitos profissionais da área podemos ver o quão frágil é o sistema em que eles atuam, em sérvio que a população precisa mas não quer saber.

Mal pagos, sob estress e pressão, muitos erram e acertam em seu dia a dia e no livro fica bem claro isso!

Existe toda uma sucessão de erros que alimentam a situação precária atual

Livro que gera muito debate e merece ser lido!

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Drauzio Varella merece o título de "melhor pessoa" e isso não é um meme. Em um mar de insanidade, ele é o homem mais sensato desse Brasil, tão insano ultimamente. Vê-lo falar em seu canal do Youtube me traz paz (além de informação, é claro). Já ler seus livros me traz reflexão - sobre a sociedade brasileira tão doente, sobre a nossa triste desigualdade social, sobre a vida nas periferias e sobre a vida dentro das cadeiras, principalmente. É curioso, mas estou lendo sua série sobre as prisões brasileiras de trás pra frente - comecei com o indispensável Prisioneiras e agora li Carcereiros, tão bom quanto, mas essa ordem maluca não compromete a leitura, fiquem tranquilos (para quem é rebelde como eu ~risos~). Esse último, uma obra com histórias de agentes penitenciários, é mais uma obra rica em histórias de homens anônimos que arriscam suas vidas diariamente e conhecem o que há de mais terrível na humanidade.

Fascinado desde criança por histórias de bandidos, Drauzio cresceu para se tornar um médico dedicado, que há muitos anos atende dentro de cadeias de São Paulo em um trabalho humanitário importante e dificílimo. Ali, ele vê muita tristeza e violência, o pior da humanidade, mas também vê o melhor dela; a solidariedade, a amizade e o desprendimento - tanto de agentes penitenciários quanto até mesmo de presos. Mas seus livros nunca são sobre ele mesmo: o autor fica à vontade sendo apenas o contador das histórias dos verdadeiros protagonistas, esses personagens anônimos, que se arriscam, ganham pouco, fazem bico, mas todos os dias são encarcerados mesmo sem terem cometido nenhum crime.

Nesse livro, há histórias para se horrorizar mas também para se emocionar; algumas são até hilárias, "causos" que o médico ouviu entre uma cachaça e outra com os colegas da cadeia. Mas o importante mesmo é refletir; como o próprio Drauzio diz no livro, "a sociedade faz questão de ignorar o que se passa no interior dos presídios". Afinal, se a lógica é apenas castigar os bandidos, por que assegurar condições dignas? Ele continua: "Nossas cadeias são construídas com o objetivo de punir os marginais e de retirá-los das ruas, não com o intuito de recuperá-los para o convívio social. Preocupações de caráter humanitário com o destino dos condenados só ganharão força no dia em que os criminosos das famílias mais influentes forem parar nas mesmas celas que os filhos dos mais pobres."

Ler esse tipo de crítica social, nas palavras embasadas e pacientes do autor, nos faz refletir sobre como nossa sociedade está doente, em como estamos fechando os olhos para as questões mais cruciais da situação do nosso país. Construir um Brasil menos desigual, preocupar-se com as camadas mais humildes e também com os presidiários, além de ser uma questão de direitos humanos também afeta o modo como todos vivemos. Já passou da hora de acordarmos para o fato de que é exatamente a desigualdade social que gera tamanha violência e infelicidade. Não há progresso em um país onde todos não tenham as mesmas condições de terem uma vida digna.

"Sabendo levar, a vida é uma festa maravilhosa" foi uma das frases mais belas que já li, ditas por um dos carcereiros cuja história é relatada nesse livro. A vida é um direito de todos. Todo brasileiro deveria ler um livro como esse, para entender isso, e entender que todos somos iguais e merecemos oportunidades e, principalmente, dignidade. Se não dispensarmos isso aos nossos semelhantes, também perdemos pouco a pouco nossa própria humanidade.

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