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“Sabe qual é o problema da ironia? É que ela serve para ganhar dinheiro, prestígio, o que você quiser, mas nunca vai servir para falar de ódio. O ódio é sempre literal”.

Há quem diga – e eu acredito nisso – que “ódio” seja uma palavra forte demais, um sentimento intenso demais. Hoje em dia vemos claramente as consequências do ódio gratuito, do ódio resultante de rancor acumulado, do ódio inflamado de líderes que incitam seus seguidores a odiarem também. Quando o ódio chega ao seu nível mais literal, dificilmente tem volta, as consequências não podem ser outras senão trágicas.

É uma demonstração pública de ódio que faz com que uma cineasta alemã queira fazer um documentário com o casal de irmãos brasileiros envolvido no caso: Alexandre, empresário dono de uma rede de academias, e Raquel, artista de 130 quilos conhecida por suas performances chocantes. Após Raquel ser espancada na frente de 600 pessoas em uma conferência sobre diversidade, cada um dos irmãos conta a sua versão do que pode ter desencadeado o ocorrido, retomando um passado familiar cheio de ressentimentos.

Posso dizer que Michel Laub escreveu um dos livros mais provocativos que li neste ano. Solução de Dois Estados, nome também dado ao projeto que visa a coexistência pacífica dos Estados de Israel e da Palestina, mostra justamente a divergência entre duas pessoas da mesma família, mas com vivências, ideais e visões política, social e religiosa totalmente diferentes.

Enquanto Alexandre pauta sua história na economia, tendo como ponto crucial o Plano Collor que destruiu a vida da família, Raquel tem como base o bullying sofrido desde a infância pelo seu corpo, que se tornou seu instrumento de trabalho e de protesto. E no embate para provar seus pontos de vista como verdades absolutas, ambos nos provocam quanto às ideias políticas extremas, às formas de manifestação da arte, à hipocrisia disfarçada de boas ações, à imposição de princípios, à isenção de culpa ao incentivar, mas não realizar, um ato violento.

Com uma dinâmica interessante de narrativa, onde cada personagem conta a sua versão dos fatos para a câmera, o livro nos propõe o exercício de conhecer e entender os dois lados da moeda, mas não necessariamente os aceitar (embora provavelmente há quem vá se identificar inteiramente com algum posicionamento). Somos colocados no lugar de ouvinte que, muitas vezes, precisa ter sangue frio para não se revoltar com as alfinetadas. Embora o presente da obra seja 2018, poderia muito bem ser 2020.

Este é um livro que tem muito a ser debatido, seja sobre família, política, ativismo, dinheiro, ódio, perdão, transformação. É por isso que eu indico para que o leiam.

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