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"A palavra que resta" é um livro sensível sobre uma realidade bruta. É uma história necessária, que precisa ser contada e raramente o é. Ainda que eu já tenha lido muitos livros com personagens LGBTQIA+ e que falam sobre sexualidade, o livro de estréia de Stênio Gardel é um dos primeiros que vejo retratando a questão no meio rural, em um passado distante mas atual, e entre pessoas simples - o protagonista, por exemplo, não sabe ler e trabalha como caminhoneiro. É um ambiente que me lembra o próprio interior de SP onde vou para visitar minha família, por exemplo, e onde comentários homofóbicos e masculinidade tóxica são tão comuns e naturalizados - e que nos fazem perceber que esses conceitos não furam nossa bolha e não atingem uma grande parte da população, com a qual não temos contato por estarmos presos em nossa torre de marfim ou na internet (falo como universitária que estuda gênero e sexualidade e que precisa tirar a cabeça do meio dos livros e ter um choque de realidade de vez em quando).
Por isso, o que eu mais gostei nessa obra foi justamente tirar o assunto "sexualidade" do meio acadêmico e colocá-lo entre personagens reais e humildes, que não têm contato com metade dos termos que criamos para discutirmos suas realidades e vivências. Outro ponto positivo foi a escrita, que segue fluxo de consciência e ao mesmo tempo não é linear. Poderia ter sido uma leitura muito fluida se o assunto não fosse tão doloroso. Para além do seu romance com Cícero e sua busca por identidade durante a vida adulta, Raimundo Gardêncio descobre a importância de traçarmos nossa própria jornada, independente das escolhas que os outros tomam por nós, e contarmos nossa própria história, para que ninguém nos tire a palavra, que é muitas vezes a única ferramenta restante no nosso arsenal.
"Gostar de homem não é pra ser coisa de morte, é pra ser coisa de vida, cheia de vida, era cheio de vida que eu me sentia com Cícero".
Bookstagram: @narrativasinfinitas
Em minha bolha de amigos literários, este livro foi o que mais foi comentado no ano passado, seja de maneira positiva ou negativa, ou por iniciar discussões até mesmo polêmicas. Eu, por outro lado, acredito que tenha ficado sentada no muro desta discussão, entretanto com os pés virados para o lado do muro que achou essa obra essencial. Por causa disto, iniciei a leitura de “A Palavra Que Resta” com muitas expectativas do que fosse ler, mas acabei tendo uma visão bem diferente.
A obra de Stênio Gardel, hoje muito bem premiada e posicionada no mercado literário, plantou na minha cabeça diversos questionamentos sobre nossas raízes, nossos privilégios, os caminhos que tomamos e o preconceito. Em um enredo que alternar entre o presente o passado de Raimundo, personagem analfabeto gay, que vindo de uma família humilde sofreu abruptamente com um romance interrompido durante a adolescência e agora adulto, com a carta em mãos de seu romance da época, decide alfabetizar-se para em fim ler as últimas palavras não ditas.
Estruturalmente falando o livro me traz uma sensação de que não foi feito para ser lido, mas sim falado e ouvido. Stênio escreve de maneira ilustrativa para que através das conjunções, termos e erros de escrita/fala percebamos que Raimundo e os demais personagens estão falando conosco ao mesmo tempo que estão sendo alfabetizados, assim percebemos a sua progressão. Achei riquíssimo como não só o texto diz, mas as palavras demonstram.
Ao decorrer da leitura, tentei entender quais seriam os motivos que levaram tantas pessoas a desgostarem da obra e percebi que o preconceito e a hipocrisia fossem talvez os motivos. Além da grosseria e crueldade que Raimundo recebe de seu pai por ser gay e vir uma realidade brutal, o personagem como maneira de proteção reproduz o que viveu na pele com seus pares, visto que diferente das comunidade LGBTQUIAP+ que tem grupos de apoio, familiares e amigos que os apoiam e espaços que os aceitam, não é o mesmo para ele e tantos outros brasileiros.
Por fim, este livro me fez perceber que a empatia é a chave para que entendamos o outro e que nem sempre o outro precisa ser entendido para ser aceito.
Agradeço a Companhia das Letras por disponibilizar esse livro em versão e-book para análise.
Uma história importante, que precisa ser contada. Relata a vida e os sofrimentos de um homem gay idoso, algo que vemos muito pouco, não só na literatura, como nas mídias em geral. A narrativa é em muitos pontos poética e bonita, apesar da história triste. Infelizmente, o estilo de escrita, com o fluxo de pensamento, sem marcação de falas não funcionou muito bem para mim. Vários trechos tive que reler para entender quem estava falando o que.
Raimundo Gaudêncio de Freitas é alguém que aos 71 anos finalmente decide se alfabetizar para enfim ler uma carta que guarda consigo há mais de meio século.
O que para muitas pessoas seria resolvido de forma simples (afinal, era só ter dado a carta para outra pessoa ler, não é?!?) para Raimundo isso é muito mais complexo, já que no papel há palavras de seu primeiro amor, Cícero.
O livro não fala em que momento se passa a história, mas se hoje já não é fácil ser gay, imagine há 50 anos.
Raimundo e Cícero são amigos de infância que cresceram no sertão nordestino, e após serem expostos, sofrem preconceito pesado de suas famílias, além do preconceito que eles mesmos já tinham.
Aqui, acho importante frisar que não há vilões e heróis nessa trama. Nada é preto ou branco, e todos os personagens que passam pelas páginas possuem dilemas bem complexos.
O pai de Raimundo é um exemplo muito forte. Ele surra o filho dia e noite mais pelo medo e tentativa de protegê-lo do que por ódio propriamente dito.
Infelizmente, a delicadeza da história encontrou um oponente difícil para que eu me apegasse completamente a ela: a escrita, que tantos amaram e eu não gostei muito.
Eu achei a narrativa bem confusa, e em vários momentos tive dificuldades em entender que personagem estava falando o que.
E não vou mentir não, depois de um tempo eu comecei a ficar é com raiva do porque o Raimundo não pediu a nenhum amigo para ler a bendita da carta.
Poxa, já adulto ele se cerca de várias pessoas queer, então não vejo motivos para que essa carta não fosse lida pelo menos 10 anos antes!!!!
Então... eu recomendo ou não a leitura desse livro? Pois é, não sei kkkk
Terei de recorrer aquele velho clichê: a leitura é uma experiência única para cada pessoa, às vezes o que eu não gostei pode ser justamente o que vai te atrair.
Eu recebi um presskit perfeito da companhia das letras, com um exemplar do livro, um marcador, um bloco de notas, um lapis e uma carta do autor.
tive a oportunidade de ler esse livro antes do lançamento, foi algo tão enriquecedor que eu simplesmente sai sem palavras apos ler esse livro, esse é um tema que deveria ser amplamente abordado, mais debatido sabe?
Esse é um livro com um olhar tão sensível e ao mesmo tempo tão forte, por que pegamos a dor dele pra nós, em diversos momentos eu tive que parar a leitura pois eu não me aguentei a emoção e acabei chorando. Esse é um livro para leitura com o coração aberto, pois é um livro que aborda muito sobre perda, sobre sentimento, expectativas, amor, família, aceitação de quem realmente somos.
Esse livro conta a trajetória de Raimundo, um senhor de 71 anos, analfabeto, que guarda a mais de 50 anos, ele decide finalmente aprender a ler para finalmente ler a carta de Cicero, alguém que amou durante toda sua vida.
Quando Raimundo era criança, vivia no interior do Ceara, tendo uma vida simples cuidando da roça, e foi lá que ele conheceu Cicero, cresceram juntos, se descobriram juntos e nunca deixaram de se amar.
um garoto que mora no interior do Ceara, que acaba se apaixonando por Cicero, com quem cresceu e se descobriu, entretanto, esse amor passa por um grande dilema, aquilo não era certo, não era de Deus, eles tinham que "ser homens", arrumar uma mulher, casar, ter filhos, afinal onde já se viu dois homens namorando? Era esse pensamento que passava na cabeça dos meninos, mas o amor sempre falava mais forte, e por isto, eles continuavam a se amar, até que um dos pais dos meninos, pegam os dois no ato, e simplesmente não aceita, homem tem que ser homem e pronto, como era de se esperar, os pais dos meninos batem "para ensinar a lição", foram tomados pelo preconceito estrutural. Raimundo estava disposto a realmente largar tudo para viver seu amor na capital ao lado de Cicero, mas ao invés de sua presença recebe uma carta, mas onde já se viu? escrever uma carta a uma analfabeto, ao ser expulso de casa pela sua mãe, ele decide então se virar no mundo, lendo consigo a carta.
"Porque naquele dia a senhora não falou em mudar, falou do que já tinha feito, como se a gente estivesse que ser o que foi criado pra ser e pronto, sem escapar para os lados, eu já tinha escapado"
A partir daí a história continua alternando momentos do passado e do presente, somos apresentados a Suzzanný, uma personagem tão carismática e que rouba toda a atenção para si. Suzzanný representa tudo do quão Raimundo fugiu sua vida inteira, a aceitação de si mesmo através dela, na minha opiniões esse foi um ponto de suma importância na historia, pois podemos vê uma parte de Raimundo através dela.
O livro tem apenas 4 partes, com capítulos curtos e de rápida leitura. Eu amei a capa, a edição, tudo simplesmente perfeito. Tem personagens tão complexos, que é até difícil imaginar que eles são frutos da cabeça de um autor e não existiram realmente.
A realidade de Raimundo e Cícero é algo que muitos adolescentes sofrem hoje em dia, não só em cidades do interior onde o preconceito estrutural é maior como em capitais e grandes metrópoles. É um livro que não deve somente ser lido, mas debatido.
Esse é sem dúvida um dos meus livros favoritos do ano. Recomendo a todos a leitura.
Falei mais desse livro em um vídeo para o canal no youtube, então se você gosta de conteúdo assim já corre para assistir
É um livro que já no começo não me cativou. A escrita é particular do autor, compreendo essa questão. Mas alguns trechos são vulgares e não usaria essa obra em sala de aula.
Este livro me provocou tantas sensações que fica até difícil de descrever o quão generosa é a escrita de Stenio Gardel ao descrever o movimento do tempo em torno do amor.
Aos71 aonos, Raimundo, um senhor analfabeto guarda uma carta, escrita por Cícero, sua primeira paixão. O romance dos dois foi frustrado pelas famílias que não aceitavam o que eles sentiam um pelo outro, afinal os tempos eram distantes e o local em que viviam muito conservador. O caminho que a vida de Raimundo segue é semelhante à de muitos LGBTQIA+ que passam anos de suas vidas se escondendo por medo da reação da sociedade, por medo do preconceito. Gardel é muito sensível ao dar vida a um personagem homossexual idoso, vindo de uma região tão humilde, bem como cria um mistério sobre o que estaria escrito naquela carta.
Uma leitura de encher os olhos d'água e coração de empatia.
Essa história me prendeu como poucos livros foram capazes de fazer, daqueles que vc vira a noite lendo, por que precisa saber mais. E uma história cheia de magnetismo. Sensível, que trás conflitos familiares, assim como ensina a ressignificar. Gostei bastante dessa história!
Eu gostei bastante do livro e de como o autor abordar certos assuntos. Algumas coisas me irritou na leitura, mas nada que atrapalhasse minha experiência. Super indico, foi uma leitura Excelente
The prose is strikingly beautiful. I did feel that Suzanný appears just to help Raimundo - we do get a glimpse of her story and her past, but through the story it feels like she is more of a plot device than an actual rounded character.
As vezes é difícil falar de certas leituras, porque você não sabe bem o que dizer.
Vou começar com o aspecto técnico, para ficar mais fácil. Em A Palavra que resta temos uma leitura mais densa, com uma escrita um pouco difícil, mas que reflete os pensamentos e a própria escrita do protagonista da história. Depois que você se acostuma fica mais fácil de acompanhar, mesmo que às vezes seja necessário voltar para reler alguma parte.
É importante ressaltar que a história possui alguns gatilhos, como Homo e Transfobia, abuso familiar. Mas essas cenas, apesar de fortes, não estão ali apenas para chocar o leitor. Elas servem há um proposito de narrativa e trazem uma crítica.
A Palavra que resta nos traz uma história forte, daquelas que te deixa pensando por muito tempo após terminar a leitura, e por mais que Raimundo seja um personagem fictício, sua história infelizmente é tão identificável e comum.
Esse livro aborda temas bastantes sensíveis, como homofobia, violência parental, agressão física e psicológica, transfobia e filicídio, o que pode sim ser gatilhos emocionais para diversos leitores, principalmente leitores LGBTQIA+, que infelizmente podem se identificar com diversos momentos da trama.
O livro possui uma narrativa em fluxo de consciência com flashbacks, que nem sempre situam o leitor e se fazem entender totalmente, mas que sinto que funcionam e não me deixaram com a sensação de completa confusão. Também possui traços dos costumes e do sotaque nordestino, com personagens que convencem o leitor, certamente se assemelhando a pessoas da vida real.
A história possui trechos de violência à personagens LGBTQIA+, que nunca é algo justificável, sendo trechos bastantes explícitos e nem sempre necessários, porém acredito que o livro peça mais aprofundamento na análise do leitor, principalmente na construção do personagem protagonista, o que torna esses trechos mais aceitáveis enquanto literatura.
Raimundo, protagonista e narrador da história, é um homem gay, que veio da roça e que está em processo de alfabetização durante a história (inclusive esse é um ponto que gosto muito e que denota a complexidade da história para além de apenas o romance entre os dois personagens). Literalmente estamos lendo os pensamentos de um homem gay, analfabeto e que forçadamente se encontra dentro do ciclo de medo e violência o qual diversos LGBTQIA+ ao redor do mundo transitam durante as suas vidas. É importante entender que comentários e ações violentas e transfóbicas que partem de Raimundo durante a narrativa tem muita relação com todas as circunstâncias da vida desse personagem, sendo preciso levar em consideração que o personagem não faz parte da bolha LGBTQIA+ da cidade grande, consideravelmente mais liberta, sexualmente falando, e na qual o processo de autoaceitação definitivamente é menos doloroso (ainda assim sendo bastante doloroso em diversos casos).
Acredito que essa história não deva ser analisada com o ponto de vista único do leitor, é necessária análise da maior quantidade de perspectivas para entender que é um livro que trata os seus personagens LGBTQIA+ como reais, complexos, cheio de camadas e falhas e isso vai causar estranhamento entre leitores que estão acostumados com a visão única do LGBTQIA+ enquanto figura pura e idealizada, o que não é de todo ruim, visto a positividade e empoderamento que esse tipo de história traz, porém se tratando de um livro adulto, me parece coerente que trate os temas com um maior grau de complexidade e realidade, mesmo que nem sempre esses temas sejam confortáveis e completamente felizes.
Stênio fez uma estreia maravilhosa com A palavra que resta e a vida sofrida de Raimundo soa muito real, porque, em suma, ela é.
Raimundo personifica a dificuldades de ser gay numa época e ambiente onde era impensável admitir essa orientação. Encontramos ele se descobrindo, por mais que o livro não se foque muito nisso, mas sim nas reações desencadeadas pelo relacionamento com Cícero.
A visão da época sobre a sexualidade, como as palavras da família e das pessoas que cruzaram o caminho dele se faz presente nas tentativas de esconder e se inserir no seu círculo de trabalho e social. Muitas vezes ele reprisa as falas preconceituosas, fazendo que Raimundo nutra autodepreciarão e não viva sua vida com plenitude. É muito verossímil, pois creio ser a realidade de muitos LGBTQIA+, principalmente daqueles sem condições de se afastar de onde não são aceitos. Também aborda o relacionamento familiar e quanto, às vezes, é possível se sentir verdadeiramente querido com as pessoas que te acolhem como você é.
Outro ponto a se destacar é como Stênio desenvolve todo o mistério do conteúdo da carta e como usa isso para mostrar outra situação bastante comum, especialmente em cidades do interior: o analfabetismo. Raimundo teve seu acesso a educação negado por ter que trabalhar junto ao pai e por conta disso, passa anos sem saber o que Cícero queria dizer. É bem emocionante ver como as palavras e as frases aprendidas vão dando sentido aos dias dele e com certeza foi especial acompanhar essa evolução.
O livro foi escrito seguindo a tradição oral e creio ser uma decisão muito acertada. Me senti mais próxima dos personagens e todas as dores pelas quais eles passam porque a narrativa se aproxima de uma realidade que vivencio sendo do interior. Então quando Raimundo fala das incertezas, do amor e das perdas imagino estar escutando uma conversa do meu vizinho, ou de um parente, ou de um conhecido de um amigo. Me parece real. Imagino que vocês também se sentirão assim.
Link do post: http://afabricadiversaoearte.blogspot.com/2021/05/resenha-palavra-que-resta.html
Tive a grande oportunidade e honra de ler esse livro antes de ser publicado, além de participar de um encontro virtual com o autor. Stênio é tudo que eu esperava do autor que escreveu uma obra tão delicada e tão forte, tão intensa e tão poderosa: calmo, com uma fala ritmada que me fez ter certeza absoluta que ele sabia bem o que queria contar e o livro mostra isso claramente. Vindo do interior do Ceará, ficou claro para mim, que sou do interior da Bahia, os pontos em comum na narrativa de uma vida marcada por trabalho árduo, homofobia e a força da família em nossas vidas, tudo bastante presente no nordeste de nosso país e em cidades do interior. Me sinto privilegiada de ter lido esta obra que, definitivamente, merece e precisa ser lida por todos vocês.
A trama é exatamente o que a sinopse nos entrega: Raimundo Gaudêncio, um homem com 71 anos, decide que precisa ler a carta que Cícero, seu primeiro amor, lhe deixou quando foram separados com violência no começo da vida adulta. Por todos aqueles anos, Raimundo guardou a carta e não deixou que ninguém a lesse para ele, e, naquela altura, decide ele mesmo aprender a ler e escolher poder fazer o que acredita precisar fazer. E assim começamos a saber o que aconteceu no passado do personagem e como seu romance com Cícero começou e tudo que veio em seguida.
Raimundo desde muito cedo começou a entender sua sexualidade, mas em uma cidade não nomeada, morando em uma área claramente rural, ele sabia que era algo que não poderia simplesmente expor sem sofrer preconceito. Logo se tornou amigo de Cícero, que entendeu os olhares do outro, e em uma cena forte e intensa, os dois enfim se beijam. A forma dos desejos dos personagens passam das páginas, fazendo o leitor entender que o acontecia ali era algo real e forte, capaz de durar uma vida inteira.
Mas havia as famílias dos dois. Quando o pai de Cícero flagra o casal juntos, a reação é a pior possível, e o homem termina contando para os pais de Raimundo, os quais obviamente também não aceitam. Vamos descobrimos mais sobre Damião, o pai de Raimundo, e seu passado, a forma como ele lidou com a homofobia em sua própria família de nascimento quando era adolescente ao se deparar com a sexualidade de outro parente que amava profundamente, e como tudo vai deixando marcas no homem que termina reagindo da única forma que podemos imaginar: com mais violência.
Em linhas temporais alternadas, vemos o passado em divergentes pontos da vida de Raimundo, e também o presente. Sem nunca se fixar em lugar nenhum, Raimundo está fugindo de seu passado, mas sem nunca fugir de si mesmo, vivendo diversos casos sem nenhum apego sentimental, até que o destino lhe apresenta Suzzanný, uma travesti com uma história de vida que a transformou em quem é. Suzanný é forte, muito forte, e mesmo depois de sofrer também com violência, ela consegue encontrar dentro dela um lugar para não perder a doçura e a esperança de tempos melhores.
Assim como no passado a família foi muito importante para Raimundo, novamente ele se encontra em uma posição de que pode ser possível firmar novamente suas raízes em algum lugar e criar por si mesmo uma família. A questão do quão necessária pessoas que escolhemos para ser nossa família também está presente em uma narrativa que vai sendo semeada de momentos difíceis, intensos, fortes e tocantes, tudo para poder construir a história de Raimundo com todos seus atores, alguns com papéis maiores, outros com papéis menores, tudo formando uma simples teia de acontecimentos que levaram Raimundo até o lugar no qual está atualmente: aprendendo a ler e escrever em uma idade tão avançada.
Mas uma grande questão é: Por que Raimundo demorou 50 anos para decidir ler a carta? Por que ele não deixou que lessem a carta para ele antes? Por que ele resolveu aprender a ler somente agora? Todas essas perguntas vão guiando o livro e também o leitor, que vai entendendo que muitas decisões de Raimundo vão respondendo as perguntas que ficaram em aberto em seu passado. A dor do que não viveu e a sensação de que haveria bem mais para viver com Cícero parece estar contida naquela carta fechada, que nunca era revelada, assim como o que eles poderiam ter construído juntos.
Não vou esquecer a história de Raimundo e Cícero tão cedo, até porque não é a história só deles dois e é sim, a história de tantas pessoas que são massacradas por homofobia, preconceito e medo. Mas não é só a história de sofrimento, é uma história de superação, de aprendizado, de libertação. Ler não traz somente o poder a Raimundo de escolher ler ou não a carta, mas responde a escolha de formar uma nova família, a escolha de se tornar alguém melhor apesar de todas as adversidades e dores da vida.
No final, a palavra que resta é justamente a palavra que você escolhe ser dita ou não. E é isso que importa.
Ah, uma última noticia: o livro teve seus direitos de adaptação comprados e provavelmente irá se tornar um filme. Mal posso esperar para ver Raimundo e sua história na tela.
Em uma escrita extremamente sensível e envolvente, vamos conhecer Raimundo Gaudêncio, um homem já idoso, que em posse de uma carta, deixada por seu grande e primeiro amor, Cícero, resolve que chegou a hora de conhecer seu conteúdo.
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A carta, escrita por Cícero, nunca foi lida, pois Raimundo não sabe ler. E ele também nunca deixou que alguém lesse por ele, deixando a missiva guardada por todos estes anos. E agora, ele decide que precisa aprender a ler e fazer o que precisa ser feito. E assim vamos saber o que aconteceu no passado do personagem, o amor por Cícero, a separação e todo resto que veio em seguida.
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Em linhas temporais alternadas, vemos o passado e o presente. Raimundo ao mesmo tempo em que foge de seu passado, nunca deixou para trás todo sentimento que carregou por uma vida inteira. O livro traz momentos bastante fortes e difíceis de imaginar. É dolorido pensar no quanto se perdeu e no quanto poderia ser vivido, se não fosse o preconceito e o medo. Uma história de muitos Raimundos e Cíceros...
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Preciso dizer que a escrita do autor foi muito diferente de tudo que imaginei. Stênio escreve com delicadeza, porém de maneira forte e consegue nos tocar o fundo da alma. Despertando os mais diversos sentimentos. Eu me entreguei por completo a esta leitura, senti cada momento vivido pelos personagens e nem sei dimensionar o quanto me senti tocada.
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Uma história intensa e poderosa que nos traz o interior do Ceará, retratando personagens tão reais, com vidas marcadas pelo trabalho árduo e a luta diária. Como também mostra de maneira intensa e arrasadora, a homofobia e a força da família em nossas vidas. Porém, além de tudo, também é uma história de superação, aprendizado e libertação.
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Essa obra aqueceu meu coração!
Eu realmente não gosto de falar mal de livros nacionais, mas eu peguei essa ARC no Netgalley em troca de uma resenha sincera. Então meio que vou ter que fazer isso.
gatilhos: transfobia, uso de nome morto, homofobia.
Cícero e Raimundo viveram um amor quando jovens, até que foram descobertos e o destino os separou. Cícero deixou uma carta para Raimundo, que a guardou durante toda sua vida e veio aprender a ler somente na terceira idade, justamente por causa dessa carta.
Começando pelo que gostei: A escrita. Ler A Palavra Que Resta me deu a sensação de estar lendo uma grande obra da literatura mundial apenas pela escrita. Eu sentia a cada instante que esse livro, apesar de publicado em 2021, poderia ser facilmente um clássico. É uma escrita que desafia, que não entrega tudo de maneira certa e que faz o leitor usar ainda mais do cérebro, nada é mastigado aqui.
Junto disso, também amei o desenvolvimento do Raimundo, protagonista do livro. Porém, tive a sensação que só ele teve um desenvolvimento bom.
Quando eu leio algo eu não peço por um personagem perfeito, mas eu peço que esse personagem imperfeito apresente alguma evolução e isso NÃO ACONTECE! Raimundo insiste em chamar Suzzanný pelo nome morto e isso durante TODO o livro. Ele evolui e passa a respeitar quem ela é mas MESMO ASSIM INSISTE EM CHAMAR ELA PELO NOME MORTO.
Sobre a relação dele com Cícero, não há espaço na narrativa para que eu compreenda de onde vem esse amor todo. O que eu vi no livro foi algo puramente carnal, não houve um desenvolvimento de romance o suficiente para que tornasse pelo menos um pouco crível o suspense através da carta.
"A Palavra Que Resta" se tornou uma das minhas maiores decepções porque prometeu uma história de amor que não aconteceu, prometeu uma carta que sequer aparece e tirando a escolha de narrativa e desenvolvimento do protagonista eu já não consigo apontar mais nada que realmente gostei.
A história de Raimundo Gaudêncio deve ser a história de muitos brasileiros por aí. Menino pobre e da roça, foi obrigado a abandonar a escola para ajudar o pai, apesar de ter muita vontade de aprender a ler e escrever. Mais tarde, quando se apaixona pelo amigo Cícero e passa a se relacionar com ele, lida com o preconceito de uma cidade pequena e conservadora. O mais difícil é lidar com o preconceito dos próprios pais, resultando na fuga de casa. E é nesse momento que Cícero entrega a Raimundo, analfabeto, uma carta. Apesar da curiosidade, Raimundo não pode pedir pra ninguém ler a carta pra ele, mas também não sabe ler. Convive décadas com aquele pedaço de papel e com a angústia de ter seguido a vida sem saber o que estava escrito.
O livro tem cenas muito pesadas, de sexo, violência, e vi algumas reclamações a respeito, mas infelizmente essa é a realidade. Quantas notícias a gente vê diariamente de adolescentes homossexuais que apanharam dos pais, ou na rua? O preconceito faz parte da nossa realidade - e não apenas no Brasil. E achei bem interessante como Raimundo também se percebe preconceituoso - com ele mesmo e com Suzzanný, uma personagem trans. Nós somos muito influenciados pelo nosso meio, e Raimundo não fugiu à regra - foi preciso acontecer uma coisa pra ele "cair na real" e perceber o quanto estava errado.
Estava muito ansiosa pra ler esse livro, e não me decepcionei. Achei uma história muito sensível e não tive dificuldade com a escrita do autor, não-linear e com fluxo de consciência bem marcado. Gostei muito mesmo!
Quando li a sinopse tive certeza de que se tratava de um livro muito necessário no contexto social do Brasil hoje, é um bálsamo ver escritores nordestinos lançando livros e sendo descobertos cada vez mais pelo público. No entanto me frustrei um pouco com as expectativas, pois encontrei uma escrita bastante peculiar que não funcionou comigo. O livro segue uma espécie de fluxo da consciência do protagonista e não indica o que são falas ou pensamentos de outros personagens, pode ser um pouco confuso. A narrativa tenta ser bem poética, mas como eu disse, não funcionou comigo, ainda assim recomendarei o livro pelo que falei no início.
Recebi o ebook desse livro pela editora, depois de ter visto a capa e a sinopse, minha curiosidade por essa história era muito grande e que eu menos esperava era desgostar dessa história.
A estrutura textual do livro foi o que mais gostei, o passado e o presente coexistem para a história de Raimundo fazer sentido para o leitor (e nem sempre faz rs), também gostei dos pensamentos do personagem principal que, claramente, demonstra ser uma pessoa ansiosa.
O meu problema com esse livro é a violência gratuita exibida em suas 152 páginas, tem zilhões de maneiras a violência sofrida pelo personagem sem que ela pareça como um ataque até para quem está lendo. A homofobia e transfobia é tamanha que em momentos, quem estava se sentindo humilhado era eu.
Não desisti do livro por querer saber o conteúdo da tão falada carta e acabei me sentindo enganado, o autor faz tanto suspense que o livro acaba e nada é revelado... Enfim, não recomendo.
“Raimundo Gaudêncio de Freitas, traço incerto, arredio ao toque do papel. Lápis danado, domado, e ele escrevia o nome completo pela primeira vez. Setenta e um anos e essa invenção, como ele diz, de aprender a ler e escrever depois de velho. Raimundo não foi difícil. Complicado era Gaudêncio, denso de saudade, as cinco vogais e acentuando. Freitas era feito de sangue.”
Começamos a embarcar na história de Raimundo dessa forma, após completar a leitura e voltar a esse primeiro trecho do livro consegui concluir que esse primeiro paragrafo possui toda a história dentro dele.
Mas estou me adiantando um pouco com tudo… A Palavra Que Resta nos apresenta a uma história difícil, cheia de percalços, dores e medos, mas que também é muito bonita. Raimundo e Cícero se conhecem desde criança e acabam descobrindo um amor, proibido dentro de suas mentes e pleno em seus corações, após os pais descobrirem o relacionamento dos 2, Raimundo parte pro mundo com um sentimento pesado e uma carta que não pode ler por ser analfabeto, coisa que decide mudar aos 71 anos. Para que assim, possa ler a carta deixada por Cícero a 50 anos atrás.
“Tu já viu que não tem jeito, não tem, a mudança vem ou a gente correndo atrás dela ou ela atropelando a gente com tudo, sem pedir pra sair do meio.”
Stênio Gardel tem uma forma única de contar essa história, alternando entre presente e passado para que possamos entender tudo e experienciar os sentimentos dos personagens. Com uma linguagem interiorana e apresentando o fluxo de pensamento de Raimundo ele aborda aqui o preconceito na sua forma mais ignorante, o medo de se mostrar como e o que se é. É impossivel não se emocionar, assim como também é impossivel não se apegar a Suzzanny (com dos zês, dois enes e acento agudo no y).
Por fim concluo dizendo que amei cada página dessa história, é fácil perder a noção do tempo aqui, é fácil encher os olhos de lágrimas e gargalhar com as tiradas ácidas de Suzzanny (me apeguei gente, desculpa). Esse livro precisa ser panfletado a todos, uma obra nacional, cearense e muito bem escrita merece ganhar espaço na estante de todo leitor.