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O livro "Padre Sérgio" de Leon Tolstói é uma obra curta, mas que apresenta uma história envolvente e profunda. O personagem central, o padre Sérgio, tem uma contradição constante e conflitante, que nos faz refletir sobre temas como a vaidade, hipocrisia e luxúria. O autor consegue trazer reflexões e críticas interessantes em menos de cem páginas, o que é impressionante. Além disso, o perfil do protagonista reflete claramente a visão do autor sobre a igreja ortodoxa em sua época. O livro aborda temas que ainda ressoam perfeitamente hoje em dia, mostrando que, apesar da evolução tecnológica, a essência humana permanece a mesma ao longo do tempo.
Livro: Padre Sérgio, Liev Tolstói
Editora: @companhiadasletras
Minha avaliação no goodreads: 5⭐
Lido em junho/2022
Arrasta para o lado para ver a sinopse ➡️
Esse foi meu primeiro contato com Tolstói e o meu terceiro com a literatura russa (Irmãos Karamazov e Memórias do subsolo). Padre Sérgio é uma novela: mais curto que um romance, mais longo que um conto.
No livro acompanhamos a jornada de Stiepán Kassátski de autoconhecimento, fé, vaidade... Embora seja uma história de 1890, ainda é possível tirarmos muitas lições dela. E acredito que quem for religioso aprenderá ainda mais!
📖 Essa edição da Companhia das letras tem 2 posfácios, que explicam perfeitamente cada aspecto da história e analisam Tolstói perfeitamente. Por isso que não vou me prender a esses aspectos nesse post (não tenho anos de estudo em literatura russa para isso 🤣). Além disso, tem a resposta à resolução do Sínodo de 20-22 de fevereiro de 1901 (e às consequências disso), ou seja, à excomunhão dele na igreja. Para mim, essa foi uma das melhores partes do livro, e você consegue ver que Tolstói colocou muito dos seus pensamentos em relação a religião nesse livro.
Apenas leiam! Fiquei com vontade maior ainda de ler Anna Karienina (tenho na edição da Companhia há um tempinho) 👀 Será que vem aí?
É sempre bom quando os leitores expandem sua bolha, e se aventuram em autores dos mais diversos estilos e escolas literárias. Dessa vez, resolvi embarcar no universo de um dos autores russos mais conhecidos da história: Liev Tolstói. E a pergunta que me faço é: Por que demorei tanto em conhecê-lo?
“Padre Sérgio” tem como protagonista o jovem militar, ambicioso e dono de uma beleza e altivez que chamam a atenção, Stiepán Kassátski. Um mês antes de seu casamento, sofre uma desilusão amorosa, e resolve abandonar tudo: Seu noivado, seu desejo em fazer parte da alta sociedade, sua carreira militar e seus bens (que os doa para sua irmã), para dedicar-se a vida no sacerdócio. Com o passar do tempo, percebe que essa não foi uma decisão muito acertada, pois muitos outros conflitos vão surgindo. Profano x religioso, pecado x moral, vaidade, orgulho, humildade, busca da plenitude, vão travando batalhas internas que o deixam cada vez mais insatisfeito e em busca pelas respostas que nunca chegam.
“- Páchenka, por favor, receba as palavras que lhe direi agora como uma confissão, como palavras ditas a Deus na hora da morte. Páchenka, não sou um homem santo, não sou nem mesmo um homem simples e comum: sou um pecador torpe, abjeto, um pervertido, um pecador orgulhoso e, se não sou o que há de pior na raça humana, estou entre um dos piores dos piores.” Posição 735
Apesar de ser um romance curto, as reflexões/críticas levantadas são bastante pertinentes, principalmente ao que se refere à Igreja Ortodoxa (mercantilização da fé, hipocrisia dos integrantes da instituição, etc.); e o papel da mulher na sociedade, uma vez que, em suas obras anteriores, Tolstói carregava um teor bastante misógino, e tentou, nessa obra, fazer uma reparação em relação a essa sua característica.
“Então era isso que meu sonho queria dizer. Páchenka é o que eu deveria ser e não fui. Vivi para os homens a pretexto de viver para Deus; ela vive para Deus achando que vive para as pessoas. Sim, uma boa ação, um copo d’água oferecido sem pensar em recompensa vale mais do que tudo que fiz às pessoas. Mas não havia um quinhão de sinceridade no desejo de servir a Deus?”, perguntava-se a si mesmo, e a resposta era: “Sim, mas tudo isso era maculado e encoberto pela vaidade humana. Não há Deus para aqueles que, como eu, vivem para a vaidade humana. Vou procurá-lo”. Posição 800
Um dos pontos altos é a narrativa ágil e fluída do autor. Outro ponto positivo é a enxuta quantidade de personagens. Mas, engana-se quem acha que, por ser uma trama curta e com poucas personagens, fica algo superficial. Pelo contrário, cada participação tem um nível de complexidade bastante interessante, que vai sendo peça fundamental na montagem do mosaico que é a mente de nosso protagonista.
Em relação a parte gráfica, a Companhia das Letras está de parabéns. A capa é bem simples e sem grandes atrativos. A parte interna é agradável aos olhos. Não encontrei erros. A cereja do bolo fica por conta do posfácio, que traz textos de Samuel Titan Jr. e Boris Schaiderman, e uma “carta” escrita pelo próprio Tolstói, em resposta à Resolução de Sinodo, que ajudam o leitor a entender a profundidade dessa obra, e plantar a sementinha da curiosidade em conhecer vida e obra do autor.
Finalizo a resenha indicando o livro para os amantes de uma trama curta, mas repleta de reflexões/críticas bastante pertinentes em relação às instituições religiosas e seus integrantes.
Tolstói sempre traz a religião em seus livros mas em Padre Sérgio, ele constrói uma critica á igreja muito intensa, nos mostra o fanatismo religioso e também a hipocrisia de seus apoiadores, nos mostra o trajeto até encontrar sua verdade e sua paz com Deus, mas deixa bem claro o quanto foi necessário abdicar e o quanto seus pecados ainda existiam nessa jornada.
🛐 Stiepán Kassátski é excelente em tudo que faz; por outro lado, assim que alcança a excelência, perde o interesse. Quando consegue o reconhecimento de suas habilidades do Exército, e prestes a se casar, resolve entrar para um mosteiro, não movido por uma devoção pura, mas pela vaidade, na intenção de ser uma pessoa perfeita.
🚫 Algumas sinopses tratam a história como uma crítica à vida mundana e um elogio à vida religiosa, mas não foi essa a minha impressão. O que Tolstói critica, na verdade, é a vaidade e o orgulho, a vida de aparências e as pessoas que abraçam a vida religiosa por motivações outras que não a piedade ou a caridade. Censura, ainda, a mercantilização da fé e a hipocrisia.
⛪ Trata-se de uma novela, ou talvez um conto longo, já que a história não tem nem 80 páginas. O restante do livro é preenchido com posfácios curtos e uma carta dirigida por Tolstói à Igreja Ortodoxa, após ter sido excomungado. A carta é interessantíssima: ao tempo em que frisa sua crença em Deus, o autor desanca os ritos e dogmas cristãos de modo geral e a Igreja Ortodoxa em particular.
🙃 Indico para um primeiro contato com o autor, embora não seja uma obra típica dele, como acentua um dos posfácios.
✨ Estrelinhas no caderno: ⭐⭐⭐⭐
a jornada do herói ou do anti-herói?
nesta novela escrita em 1890, tolstói nos presenteia com uma narrativa repleta de questões humanas que nos fazem refletir. religião, moral, orgulho, vícios, vaidades e a alta sociedade russa em decadência. a ficção parece ter um fundo autobiográfico aqui, pois reflete as preocupações da reta final da vida do conde tolstói, essa sua desconfiança e desencanto com tudo ao seu redor dá origem ao “tolstoísmo”, uma filosofia própria com diversos adeptos.
escrita durante uma crise moral, religiosa e conjugal de tolstói, padre sérgio parece ser o maior representante das suas dúvidas anti-dogmáticas, anti eclesiásticas e misóginas. stiepán kassátski, a um mês de se casar, com uma carreira militar em ascensão e com uma imagem social consolidada, resolve abandonar tudo e segue carreira religiosa. torna-se padre sérgio, e com essa sua súbita conversão, acreditava-se que estaria saindo de um mundo repleto de tentações e ambições.
contudo, como nada é o que parece ser em um primeiro momento, e que tolstói como ninguém sabe descortinar os lugares mais secretos e obscuros de seus personagens, mesmo em uma narrativa curta e compacta percebe-se a complexidade psicológica do padre sérgio. adentramos nos profundos rincões de si que ele tentava esconder até mesmo de deus onipotente e onipresente: o seu desejo pela perfeição, superioridade e o seu orgulho.
ao deparar-se com as suas falhas que o desvia da redenção, padre sérgio tem um caminho repleto de obstáculos a serem ultrapassados. o monastério não foi o suficiente, ermitão também não e nem padre milagreiro, como alcançar o seu anseio central, a expiação da alma? assim, mais do que a trajetória de um herói ou de um anti-herói, padre sérgio é a trajetória de um Homem, com suas imperfeições, comportamentos e situações sociais próprias do ser humano. é tolstói escrevendo e traduzindo de maneira única o que é ser humano e suas nuances.
além disso, gostaria de fazer um adendo, as personagens femininas de tolstói sempre me deixam com uma pulga atrás da orelha, anna karênina é um monumento labiríntico, mas percebo que ele sempre trás o pensamento moral de existir uma imagem certa de ser mulher (a mãe e dona de casa), enquanto a errada (vista como o próprio demônio em padre sérgio) é excluída. não devemos esquecer que não é só o contexto forma um livro, mas um livro forma o seu contexto histórico-social. desse modo, é de se esperar que essa pregação de tolstói encontrou eco na sociedade russa da época.