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"Encruzilhadas" é o mais recente livro publicado pelo autor que tanto admiro Jonathan Franzen. Tive uma experiência de leitura positiva, com algumas surpresas no caminho e muitas comparações com as outras obras dele. Em primeiro lugar, Franzen trabalha muito bem os altos e baixos das relações familiares. Em todos os seus livros, esse parece um ponto focal, além de elemento necessário para promover uma estrutura narrativa onde diferentes pontos de vista se cruzam para narrar uma mesma história. Em "Encruzilhadas", isso não é diferente. Aqui, a história é narrada da perspectiva dos diferentes integrantes de uma família religiosa que tem como centro Russ, o pastor assistente de uma igreja protestante no meio-oeste dos EUA. Enquanto Russ ora resiste, ora se entrega à uma arrebatadora paixão por uma das paroquianas e lida com uma antiga rixa que alimenta contra Rick, outro pastor da congregação, sua família passa por crises particulares. Como sempre, as motivações e dores das personagens são muito bem alicerçadas em delicadas vivências do seu passado. Franzen tem um talento imenso em construir caráter ligado a acontecimentos relevantes para cada personagem, dando vida e tridimensionalidade a suas ações e personalidades. Marion é a personagem que mais me agrada - apesar de toda a sua energia, independência e iniciativa, se vê diversas vezes em segundo plano nas suas relações amorosas, principalmente com Russ. Perry, o segundo filho mais novo, também é uma personagem intensa e que me atrai muito pela forma como se desenvolve de forma única. Por um lado, um garoto brilhante. Por outro lado, preso a vícios e perturbado pela sua própria mente. Clem, o mais velho, é uma boa representação da contradição liberal dos norte-americanos - aproveita do seu privilégio para estudar e libertar sua mente, mas convive com um forte sentimento de culpa por viver esses mesmos privilégios, que colocam sua convocação à guerra do Vietnã como algo facultativo, enquanto muitos jovens marginalizados são recrutados ano após ano sem muita escolha. Por fim, Becky, a segunda mais velha, é uma personagem especial. É apresentada como a típica menina popular de um bairro privilegiado, mas vive suas próprias batalhas morais enquanto encontra um caminho próprio em direção ao divino. Aliás, a fé e a relação particular que cada personagem tem com ela é um dos pontos mais interessantes do livro. Enquanto Russ vive em conflito com a ideia de nunca ter de fato "sentido a presença de deus", Marion e Becky encontram sua relação com o divino de formas paritculares e muito idealizadas. A relação que cada personagem constrói com a sua própria versão da fé afeta diretamente suas ações e a sua sorte. Por vezes, os levam a uma caridade cristã autopunitiva, enquanto em outros momentos parece dar certa permissão ao egoísmo. Ou seja, o caráter interpretativo das mensagens divinas faz toda a diferença para o andamento da narrativa. Há também uma camada especialmente interessante aqui - os contrastes sociais, apontados principalmente na relação entre os jovens privilegiados de New Prospect e a comunidade Navajo, que sofre com a exploração do homem branco. O caráter missionário dos protestantes brancos é cada vez menos popular nas terras navajos, que se dão conta do perigo de construir certas pontes e afetos. Essa noção, por si só, causa uma verdadeira revolução na igreja protestante de Russ, que deixa um pouco de lado as orações e estudos do evangelho em prol de exercícios pseudo-psicológicos que promovem catarse (e são potencialmente perigosos). Jonathan Franzen, através desses contrastes e evoluções, fala sobre a construção de uma nova forma de se portar diante da fé e das instituições religiosas. Trata da fé em suas contradições, renúncias e variações - todas elas, enfim, servindo ao próprio ego do ser humano. É um interessante estudo de personagem, através das relações vividas naquela família protestante. Não é o meu preferido e por vezes confesso que perdi um pouco a conexão com algumas personagens que, inicialmente, me cativaram (como Perry e o próprio Russ, uma personagem que, em dado momento, parece servir muito mais a vergonha e humilhação). Em alguns momentos, o livro é um pouco arrastado na minha opinião, principalmente quando traz longas sequências de flashback para embasar algumas pequenas decisões das personagens (como quando entendemos melhor a história de Russ). Nada disso fez com que a leitura não fosse positiva. Pelo contrário, vale cada página.

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