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"Passeio ao Farol" oferece uma narrativa desafiadora e profundamente introspectiva. A imersão no fluxo de consciência pode ser complicada para os leitores menos familiarizados, apresentando um emaranhado de pensamentos e vozes interiores de cada personagem. No entanto, o romance se transforma em uma jornada poética, mergulhando nas psiques dos personagens e revelando a poesia inerente aos diálogos e pensamentos mais simples da vida. . A descoberta reveladora no posfácio, demonstrando a presença marcante da autora em cada personagem, acrescenta uma camada de intimidade à obra.
Obrigada a Companhia das Letras e a NetGalley por disponibilizar o arc de "Passeio ao Farol" em troca de uma resenha honesta.
“Sim, claro, se amanhã fizer tempo bom. [...] Mas você vai ter que madrugar.”
A última vez que eu havia lido um livro da Virginia Woolf foi ano passado, com "Orlando", e "Passeio ao Farol" me lembrou que a sua escrita entrega tudo o que sinto falta quando leio outros livros — nuances e detalhes que me fazem enxergar aquele personagem como uma pessoa, com profundidade psicológica palpável. Enquanto lia, me esqueci que aquela não era uma família real que eu espiava através de uma janela. A voz de Woolf é muito característica da autora (como o fluxo de consciência, as descrições de uma vida comum e as divagações dos personagens sobre pequenas questões) ao mesmo tempo em que ela desaparece no segundo plano.
Com isso, quero dizer que Woolf deixa as personagens dela serem e viverem de modo autêntico nas páginas — em nenhum momento sou catapultada para fora do livro e lembro que essa é uma história conduzida por uma autora com certas intenções e um enredo estabelecido. Como eu disse anteriormente, muitas vezes sinto que a voz do autor é perceptível na narrativa: sinto o autor querendo moldar meus pensamentos e impressões sobre os personagens e suas atitudes, sinto que sou conduzida contra a minha vontade a tirar certas conclusões. Com Woolf, isso não acontece. Ela realmente “mostra em vez de contar” e deixa as personagens carregarem o livro para onde eles quiserem levá-lo — nesse caso, para o farol.
Não conheço outras traduções deste livro, mas essa edição da Penguin tem toda a qualidade que a coleção promete e entrega sempre. Foi uma leitura muito fluida e natural. Esse foi o livro da Woolf (até o momento) que mais me envolveu. Apesar de pensamentos que se enrolam e algumas descrições densas, como é típico das suas obras, foi o livro de Woolf que li mais rápido e mais me prendeu.
De maneira geral, as partes 1 e 2 me intrigaram mais que a parte 3, porque fiquei envolvida com a dinâmica do casal Ramsay (seus oito filhos, com exceção de James e Cam na última parte, não têm tanto destaque) e Lily Briscoe, uma pintora que faz parte do círculo social da família. Mas essa leitura foi uma experiência incrível — talvez a minha favorita da Woolf — que vai ficar comigo por muito tempo.
“As Graças haviam unido seus esforços em campos floridos de abróteas para compor aquele rosto.”
A sra. Ramsey é uma das personagens femininas que mais tive o prazer de ler. Ela tem muitas faces: mãe de oito filhos, casada com um homem por quem sente emoções conflitantes, conhecida por sua beleza e condutora da vida de todos de sua esfera (e muito casamenteira!). Apesar do marido achá-la pouco inteligente, Woolf contradiz essa impressão quando nos mostra os funcionamentos internos de sua mente. De forma irônica, Woolf revela o tempo todo, na verdade, que a sra. Ramsey faz reflexões mais complexas que seu marido e é uma ótima observadora do que acontece no seu círculo social, mas é subestimada por ser mulher e dona de casa.
“Queria compaixão. Queria que confirmassem que também ele vivia no coração da vida; que precisavam dele; não apenas aqui, mas em todo o mundo.”
O sr. Ramsay é, simultaneamente, admirado e odiado por quase todos ao seu redor, incluindo seus filhos. Conhecido por sua severidade, ele também é um escritor e pensador exaltado pela sua intelectualidade. Contudo, quando estamos no seu ponto de vista, vimos suas inseguranças e sua necessidade de ser lembrado e lido. Apesar do exterior confiante, ele tem medo de ser esquecido e cair na obsolescência, mostrando mais uma vez a complexidade dos personagens de Woolf.
“Quem sabe o que somos, o que sentimos? Quem sabe, mesmo no momento de intimidade: isto é conhecimento?”
Lily Briscoe é amiga da família Ramsay. Ela é pintora e uma mulher independente, que não tem o objetivo de casar e ter filhos. Porém, ela luta contra a misoginia que internalizou de tanto ouvir e ser exposta a comentários detestáveis e sexistas como os de Charles Tansley, que acredita que “mulheres não sabem escrever nem pintar”. Ela também enfrenta o que hoje chamaríamos de “bloqueio criativo” e “síndrome do impostor”. A personagem de Lily Briscoe representa todos os tipos diversos de artistas e principalmente, a mulher artista, cujas dificuldades Woolf conhecia muito bem e enfrentava na época.
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