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O frio...
O que se sabe é que este frio extremo, que paralisa os movimentos e a fala da pessoa, acomete apenas os negros.
Pouco se sabe sobre o frio.
Zé Antunes foi o primeiro a alertar sobre o aparecimento do frio, mas ninguém parecia acreditar em uma ideia tão estapafúrdia. Ele havia chegado à cidade e passado a frequentar entidades e bares frequentados pela comunidade afro, mas não era levado a sério.
Até que... O menino Josué aparece batendo queixo, coberto por todas as roupas e toucas de que dispunha, tentando aplacar o frio.
De tão enregelado, nem conseguia falar e apenas lacrimejava.
Ele é levado ao médico, que não faz ideia do que se trata. Não é nenhuma doença conhecida, e nenhuma citada no tratado Doenças africanas no Brasil, do dr. Octávio de Freitas.
Sim, o livro existe, assim como muitos dos personagens citados, médicos, jornalistas, poetas, militantes dos movimentos negros.
O autor nos apresenta um panorama da situação da comunidade negra nos anos 1970, que tenta se mobilizar por melhores condições de vida. Mas até mesmo a união entre eles é abalada por influências externas, que criam conflitos entre os diversos movimentos, enfraquecendo-os.
E, agora, este frio.
Bem quando estavam inaugurando a estátua de Zumbi dos Palmares.
Este frio que faz com que o negro vá desaparecendo
O frio, descrito pelo autor, é branco.
Este frio, assim como os brancos, acabam por silenciar os negros.
Uma leitura agoniante.
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A descoberta do frio
Oswaldo de Camargo
136 p
Companhia das Letras, 2023
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Através de uma inovação única e um texto bem escrito, Camargo tece críticas profundas, fazendo o leitor refletir e entender como o movimento negro é heterogêneo e carregado de viés ideológico que atravessa as distinções sociais. O autor construiu uma metáfora excepcional com o frio na trama e promove discussões sobre preconceito, negritude, coletividade negra.
Um livro fantástico e com uma estética primorosa.
Pessoas começam a desaparecer, após serem acometidas por um repentino frio. O que elas têm em comum? São todas negras. Muitos tentam alertar sobre o estranho frio e os desaparecimentos, mas a sociedade se mantém indiferente ao que está acontecendo.
Com essa premissa, o autor Oswaldo de Camargo, cria uma história inteligente, que usa a metáfora do estranho frio que acomete somente negros e que ninguém dá atenção, para falar sobre o racismo. Inúmeros são os casos de pessoas que relatam ter sofrido racismo no Brasil, porém, nada de concreto é feito para enfrentar o problema.
A Descoberta do Frio é um livro curto, mas com uma mensagem importante. Foi meu primeiro contato com o autor e me interessei em conhecer mais do seu trabalho. Recomendo a leitura!
Esse livro fala sobre um frio que assola apenas a parcela negra, mulata e de criolos da população. Quando comecei a ler eu sabia apenas isso sobre o livro, não conhecia o autor e, admito, não conhecia as referências que aparecem ao longo da novela. Entretanto, o autor construi uma narrativa envolvente mostrando como um grupo de pessoas onde seria esperado o apoio mutuo, na realidade parece se dividir em grupos específicos, que julgam-se entre si. Um dos personagens principais, que é o próprio frio, é questionado pelos próprios personagens sobre sua origem: seria ele uma analogia sobre a segregação racial? um delírio? ou uma doença real?. Zê Antunes faz o papel de tentar provar a sua existência, sendo sempre duvidado por todos que os escutam. No fim, achei um bom livro com narrativa super fluida (li em apenas 2 horas) com ótimas discussões e reflexões.
*Obrigada ao Netgalley e a editora Companhia das Letras pela oportunidade de ler esse ebook.*